30 de out. de 2011

Ela Potilla, trocava de telefone toda terça-feira. Ligava pra 
Telesp e comprava um cast inteiro de combinações numéricas, pra ir mudando a cada ida e vinda. Naquelas, ficha era caro, à cobrar era heresia e ainda tinha que esperar completar. Mas o caras ligavam, punham gancho, punham todas as fichas, não completavam a fome dela. Era cômico ver tanto desespero no ponto de táxi, no telex da praça, na porta do bar. Tinha quem pedisse dinheiro emprestado, contatasse detetive, fizesse dívida; ninguém conseguia capturar de novo aquela voz fina e que pouco se ouvia, da mulher tão querida e tão procurada, da que só saia de noite e não dizia o nome, e cercava a nossa carne como uma mosca crua, pousava com apelido de doce e pulava, maltratava, remoía. O sujeito que cruzava era pego como ateu por fantasma, no meio da noite, quando tava dando adeus ao bar, ou voltando do trabalho, sempre de surpresa. Geralmente ela usava um perfume doce da Rox-corse, pontava com uma cigarrilha preta, de charme, porque dizem que não fumava com stato de viciada. Mesmo assim, caro, não é como se imagina no meio da noite uma entidade de macumba, de tão feminina que vira inferno vermelho; era ainda, só uma santa mulher que usava guardanapos pra enxugar a tez, que fingia como pouca gente o medo de estar sozinha naquelas ladeiras confusas do centro. Pisava com sapatilhas brancas e discretas o paralelepípedo ensaboado pela garoa, quase caia, gritava de jeito breve; a isca então se oferecia para segurá-la; pegava pelo braço, levava até em casa, era calcinado. O pouso era sempre na maloca do hospedeiro, e nem sempre era completo, já que a nossa Potilla copulava sem parar de bater as asas, só deixando sobre a vítima o abdome de epilético, e o movimento ostensivo de depósito dos ovos da solidão do enlouquecimento .Boca seca, seca moda de roupas cor de pele e peles texto de dor, numa noite doente e de 
delícia.


Depois das seis, com efeito de glam no corpo, de parafuso colado na língua, de uma íngua que não deixava saltar pra frente a fala, o hospedeiro levantava sem Potilla; rico, padeiro, pedreiro, desempregado, assassino, virgem, devasso, cachaceiro, excomungado. Não tem como não subornar a verdade do uso das rimas, nem do oposto que não é tão novo assim. Levantados com a carne perfurada pelo amor-ampola de Potilla, com uma coceira doida de “miss ya”, de vida perdida, os podres homens tentavam se lembrar da combinação do número de telefone sussurrado por ela, ou até mesmo deixado de rascunho no tal guardanapo que ela sempre gostava de esquecer com os fiapos da meia-calça e algumas escamas douradas em cima da cama ou do sofá...Ela não deixava endereço, sobrenome, logradouro... O que se repetia pela vizinhança toda era um nome dito em silêncio de fim de prece, e qual aumentava de passo, num trem que acelerava sem partir. Fumaça, fumaça... fumaça da Maria Potilla sem nombre. E explodia, depois de cumulado, as carnes das larvas cheias do tapuru violento das alucinações paixorozas repentinas; Nelsinho vendeu a empresa que tinha, separou de Amália e virou paraquedista pra esquecer do golpe de ter ligado pro número sem nome, inexistente rastro falso; Domenico comprou chicotes, pediu perdão e ordenou à esposa que o amarrasse na pilastra do parking do prédio e o consumisse no couro como escravo no tronco a cada oito dias. Ele roía as unhas dos pés e o rejunte do piso pra se punir, não sabendo mais distinguir se barata era bicho de pé ou joaninha. Insano ; Fiodor desapareceu depois de sair pelado na rua gritando por ela, com carne de carneiro e pêlos nos lábios, numa manhã de sexta-feira santa. Não era fácil o baque de tê-la e não tê-la, de não sê-la como tal era, de una noite solamente; de passar dias enganchado no gancho dos códigos morse dos pulse-tones, expendendo dinheiro, perdendo emprego... Mas a galera insistia em tomar veneno pela boca com funil de aço e ferrugem. Eu atendia mais de trinta todos os dias querendo saber dela, o nome real dela, endereço. A confidencia de um bom funcionário público não deixava que eu desse repostas que comprometessem a privacidade da minha ama desloucada. Tivemos que acionar a polícia depois que Lázaro matou o irmão Figueira com uma espada japonesa; tava ficando tudo sério, pelo que parece e a minha frieza não deixa ser tocada ou co-movida. Eu creio que eles nunca a amaram de fato, só tinham o ódio de conseguir invejá-la profundamente, como quem quisesse, pra voar de noite, ter cílios postiços, vagina e arma./(...)part 1/ 

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