17 de set. de 2011

O tédio me comendo solto, Final post series.




 Hoje passei a noite aceso, no mesmo pique dos postes velhos da cidade nova, que não mais funcionam. Fiquei esperando o sono chegar, a luz da light falhar, mas eram apenas o sódio, o lítio, o cádmio, tudo que faz a gente ficar alto, que me pegavam. Vislumbrei o umbral de fora, da encruzilhada, e não vi o diabo; tão pouco qualquer célebre cantor de blues pra ninar a ciranda da minha hipomania; poderíamos nos sentar na calçada anônima, mexer com as mulheres imaginárias, adoráveis fantasmas dos anos vinte, compor alguma coisa que fizesse sentido só para nós, pra nossa tristeza, que destruísse o abrigo de todo o resto de mundo pela justa franqueza de sentido; transformasse esse gueto num buraco negro, comendo toda a luz fraquinha dos domínios opressores imperiais...Mas só havia a do poste, só havia a minha, que me engolia...


A madrugada de Setembro de uma década tão reticente, tão silenciosa e tão sem utopias, tão sem luz e sem noite-calada, tão sem rock e sem blues, seguia me varando como um jogo de espadas que seguram o reator sentimental, como varetas que impedem a fissão tão natural das coisas, da explosão sem par das tendências às infinitivas palavras, aos infinitos pensamentos... Fiquei à espera daquilo que jamais tão remoto esteve, à espera do sol verdadeiro, o tal “sol-da-noite” , aquele que foi avistado certa vez pelos homens sem face, e aquele que por isso lhes custou a amarga visão do outro e de si mesmo; a percepção de que os outros sóis comuns dos dias eram apenas uma eterna e dramática reprise de uma estrela há muito tempo finada, persistente em brotar, como que um consolo à inocência detida, onde haveria de restar tão somente o imitar contuso do farol gigante, e a todos os dias brutos regar com plasma e sangue das guerras repetidas contra os rostos que não fossem os seus, o mais narcísicos utensílios... Antes, no início, no princípio, na luz que não era a de poste, era tudo fluido, fugaz, perpétuo; os sorrisos eram sem-dentemente telepáticos, e as penetrações octoplo-fractais e circulares; os hijos já nasciam grandes, também circulando e se sorrindo, plenitude das mentes. Eram todos profecia e profetas. Eram todos. Com o sol verdadeiro e bonito, se viram ricos, rico-pobres, sábios-pops, dentro e fora, seco e lubrificado, vivo e morto, os movimentos apressados do coito angustiante...viram dia e noite, vida e morte. Criaram então a anestesia e a poesia, de tão inutilmente sabidos que ficaram, só pra aliviar...

As horas vãs passam e eu não me alivio, não vejo o tão falado sol; o blues se vai daqui, naquelas levadas que são só tempo-contartempo, pêndulo eterno balangando tenso, como quando eu estou sozinho e impotente. Vai saindo Mercúrio lindo no horizonte, a primeira das muitas falsas estrelas, mas que também é falso planeta, uma alucinação catártico-coletiva. A luz do poste vai se minguando, do mesmo jeitinho da lua, a qual mesmo inteira é vazia quando cheia, uma miragem do nosso capricho. Aprecio com calma o gigante que vai saindo no leste. E os meus olhos, que vão e vem, pouco perplexos por não conseguirem ejacular uma só lágrima, no acasalamento do mundo com o seu fantasioso, se fecham e me cegam, com o tédio me comendo solto (solto, solto, solto).

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Sobre o Autor

Arquivo do blog