20 de ago. de 2011

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Super-Egg


Parte I

Ego e tormenta


Sessão I





Eu só queria dirigir o meu Chevy. Mas ela era obstáculo de final de rua de terra, empoeirada, na sua cara. Tinha aspecto difícil, como a própria palavra aspecto parece querer esfregar na cara nossa e da gente com todo o pó; Nem saia da condição dela mesma enquanto sentava e cruzava as pernas de gambitos, que com aquela sainha florida dava pra ela um jeito de Eva nova lá do Sinclair; depois disso, o magro corpinho, moreno, com sardas distribuídas pegas não sei de onde, puro charme, se arrumava na cadeira do consultório e aí começava a sua arte de não estar. Eu hablava, como um bom paciente metido a paciente bom. Hablava, falava, spoken sem has, com ré, marcha à diante, risonho, ousado, tanto fez e faz. Nada mobilizava de início aquele corpo pra algo que fosse a borda das apresentações que a formalidade faz para encobrir os constrangimentos. Nada mobilizava aqueles olhos magros, aquele corpo, pretos como a tinta dessa caneta, nem aquele cabelo ajeitado, bem liso e oriental, que se precisava salvar do vento, mas não das chuvas; sabia a terapeuta Míriam como ser tudo só estando ali: só me ouvindo, ou então viajando no último sorvete tomado, nos últimos beijos dados em qualquer parte, de uma conta de água abusiva que pensava ser motivo para início de uma batalha judicial infinita(...) Batalha por metros, centímetros cúbicos de dignidade.

Ela era do jeito que tinha nascido e crescido, pronta para esconder de tudo; os tais olhos serviam para que ela repelisse o medo, num enfrentamento natural e ojeriza mútua que a escuridão tem dela própria; repelissem também a insônia, a sorte, o ódio, a risada, o olho do outro e o seu mesmo em qualquer distância; era digna e pura a minha heroína do blasé terapêutico moderno semanal; não queria saber se eu era feliz, se torcia para algum time de futebol, se eu me contorcia de loucura da minha Tênia-solitária-sentimental-refratária que insistia em não ficar pra vida satisfeita (…) Agora eu tinha dois vermes: um dentro que me matava pelas culpas das mortes de que ainda eu não sabia, não me revelava; um outro de fora, que sem um movimento, sem diploma e sem lamento, já me fazia anêmico da minha piora e da minha estranha relação com o mundo que, aos poucos, me cuspia mais para dentro dele, e também dela. Uma hora na sala escura. Continua depois, na próxima sessão.

8 comentários:

  1. o que era mesmo que estava escrito nessa imagem genial do cão?

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  2. deletei, sem querer.

    aeuhe. não consigo parar de rir disso.

    passao link desse "meme" original? da foto com os dizeres? bjo

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  3. que bom.ria bastante. Tô tentando achar, mas não lembro mais de onde eu copiei essa imagem =/

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  4. http://fimdostemposhoje.blogspot.com/2011/07/dorgas-larguei.html

    TcharÃn! achei, finalmente. =DDD

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  5. várias insanidades relacionadas em:

    http://www.ocioso.com.br/index.php?busca=dorgas

    Bjoviskys =)

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  6. "os tais olhos serviam para que ela repelisse o medo, num enfrentamento natural e ojeriza mútua que a escuridão tem dela própria; repelissem também a insônia, a sorte, o ódio, a risada, o olho do outro e o seu mesmo em qualquer distância..." isso tá cada vez melhor.

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