29 de jul. de 2012

Balões de Festa




Adultos brincando de faroeste matam menina de dez/onze”. Acho que esse poderia ser um título pra manchete que por acidente encontrou meus olhos ontem/hoje. Primeiro porque rima, e isso é bonito, ainda que escorra todo o triste em dizer. Dane-se, não sou jornalista, e talvez por isso tenha menos medo de assumir que a beleza de uma declaração dessas em capa de site, de revista, de jornal esteja sempre acima do que ocorre, já que deste fato se veste tanto, em palavra portuguesa mais legítima, que pouco importa a essa gente o defunto: desde que o terno (o “fato” traduzido e a doçura falsa, ambos na mesma palavra) ornamente com cuidado o ineditismo do mesmo, do choque, à procura do decoro necessário para dizer que matamos crianças. E como bem cínicos, ternos no nosso fato, procuramos vestir pela metade os acontecimentos mais complexos, tal como a personagem Major Vidigal,na cena final do famoso livro de cabeceira de todo estudante do ensino médio, inclusive daqueles condenados ao sem-futuro do funcional analfabetismo; estes entenderão a metade da notícia, a metade do livro, a metade do terno e do fato que digo... Metade do complexo cinematográfico estilo em que se dividem os tiros e se faz análise pra saber de onde veio a bala, da nossa metade bandida, ou dos nossos mocinhos, que usam uma caveira no uniforme.

Ela era uma menina pobre, que provavelmente não teria acesso ao todo da educação, a cuidados psicológicos caso sobrevivesse. Acho ainda que cresceria e seria uma mulher pobre, casada com um machista pobre, com ejaculação precoce, bêbado e metido a macho com mulher, desses mesmo que andam por aí com carro ruim tocando música ruim em som alto; talvez ela trabalhasse e viesse a ter com muito sacrifício um subemprego em que pudesse ajudar os pais a serem menos pobres, ou ao menos dividirem entre si mesmos a pobreza e sentirem por um instante que deram certo nessa vida e que criaram uma boa menina. Iria se divertir nos bailes, antes de encontrar o seu cachaceiro-encantado, pra quem mentiria dizendo que foi ele o primeiro... já teria amado, sido amada, contudo; vivido. Trivial. Iria se divertir, talvez, com coisa simples; talvez viesse a servir como devota numa igreja na favela (cuja metade dá-se o nome de comunidade); trabalharia na zona sul daquela cidade, ornando apartamento de alguém interessante: o primo do amigo do cunhado, que agora é ex-cunhado, do famosão X da novela... Voltaria correndo pra casa, orgulhosa disso, de contar pras amigas que rico fede, apesar de todo cloro que usam para branquear tudo. E riria ela de tudo isso, foleando uma revista para deixar o cabelo mais liso; quase impossível, entre o ruído da caveira nas vielas e dos tiros. Anoiteceriam esses dias também. Vidigal subiria o morro, pelas metades, como sempre, com 1000 canais em alta resolução por um preço amigo, de homem da lei. Compraria, se divertiria com desenhos, filmes, jogos de pôquer, campeonatos estranhos, notícias das guerras daqueles loucos árabes que explodem tudo. Veria um quarto dos canais, talvez até menos do que isso. Tudo muito difícil.


O filme de bangue-bangue, com as mesmas figurinhas de sempre, na mesma cidade fantasma, cidade escura e clara, porém, não permitiu que o mais banal da determinada estrutura social, desse à vida suja e parca o direito de subir a sua ladeira, sem dinheiro e sem nada do que ele compra, seguir seu curso em paz: Viver no bloco D, ir para o C, a cedilha amassada da nossa miséria de ter o 50% qualquer de toda coisa e sonhar, (sim, sonhar!) em chegar ao A magis, e poder ser a metade mais completa e salva de todas. O hemisfério em que se possa brincar com a segurança de ser pra sempre protagonista de si mesmo, nunca figuração; um canto desse mundo onde se possa sonhar em ser chico. Rei, policia e bandido; longe de toda essa lógica burra, que nos fadiga e divide, na cabeceira.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Sobre o Autor

Arquivo do blog