O ÍCONE
O ícone está morto. Bandeiras ao lado; elas ficaram em pé por
tanto tempo, quase aladas na ignorância dos nacionalismos, que
ninguém teve a coragem de sacar nelas meio pau, elas permaneciam
como se o herói nacional ainda estivesse vivo. Foram recolhidas
todas as janelas com cortinas azuis e largas, que involuntárias
diriam que o povo já nem tinha pretexto pra corar os dentes; Os
estudantes da nossa pátria já não se sentiam contentes em decorar
fórmula alguma; projetos, nomes, carreiras, diplomas eram todos
encerrados com bruta calma no país brasil. Sim, calma, porque não
existiu berro ou revolta. Nem assim! O ícone estava morto, e não
havia mais razão nem para briga: o ócio e o movimento viraram um
coiso só nas avenidas, sendo que o trânsito ficou estático no
vazio do zero por hora. Poucos pedestres riscavam as faixas dos
centros das cidades, e o setor financeiro era só o luto dos papéis
sem valor de ação de uma economia colapsada. Para quem e o quê
vender, além das caixas de faixas negras, comprimidos, metade e
inteiros para curar o choque pela morte? Parcelamentos ficaram
subitamente inúteis; não se sentiam vontades de se pôr brilhos nos
braços nem nos olhos. Roça, nem sequer metrópoles daqui.
Um guarda aposentado reapareceu no seu posto na Rua Mercúrio,
falaram, pra tentar fazer contravenção ao pessimismo da família e
foi enxotado pelo vento e o silêncio dramático do que parecia uma
cidade do interior, até antes da tragédia passada, uma
cidade grande; agora é Agosto, e poucas coisas ocorrem fora da
curva. Os homens e mulheres e os que há entre eles ficam em casa a
lamentar um passado de glória, sedimentando a falta do ídolo,
céticos de sua saída deste mundo. Esperam notícias, vasculham
páginas de internet, ligam e desligam o rádio. Só podem estar
mentido, só podem, não é crível, é sabotagem, gritam alguns no
buraco de oito milhões e meio de quilômetros quadrados, um fosso na
crosta do mundo;um lugar que nunca quisesse ser descoberto ou
maltratado. O guarda fechou o portão que ninguém arrombará. Não
há a quem pedir perdão ou simular. Açoites para quem, agora, na
nossa costa, Deus? Nas nossas costas, não...
A manutenção de rua já começava a faltar nos postes de luz, nos
fios de telefones; ninguém conseguiria com racionalidade conectar
coisas inertes se o que nos , o que lhes, o que se fazia importante
se foi. Portões e porões de celas afrouxados. Mas, por curiosidade,
não ficou ruim sair à rua. Na verdade, não se pode notar o que
houve com precisão, pois o que tinha sobrado depois da morte era o
viver, o cada qual pelo qual e si só. Vencidos sete semanas do fato,
e o luto não acabou, não tinha acabado em nossa pele; o brasil não
tinha se recuperado, e se perguntaria da necessidade de tal? Da falta
daquela imagem? Toda piedade e afeto normais eram escassos exceto, e
com muita exceção, pra dois Namorados na Sé deserta, olhando um
para o outro num futuro sem espelhos e sem choro . O ícone estava
morto.
Juliano Salustiano.
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